Lembram-se daquela publicidade de 1996 da 'Nike' em que uma horda de criaturas diabólicas enfrentava, num Coliseu reavivado, a nata do futebol mundial? Estavam lá todos: Cantona, Kluivert, Rui Costa, Ronaldo, Wright, Maldini...a missão era esta formação humano-estelar levar de vencida a das trevas. Apesar do início turbulento, Cantona lá acabava por desejar boa viagem e despedaçava a ameaça com um remate fulminante. Muitas semelhanças encontro entre esta publicidade e - contrariamente à 'remontada' do anúncio - a incapacidade do Benfica em expulsar os seus próprios demónios e utilizar a presença no Dragão como bálsamo catalisador de uma vitória que arrumava de vez com o campeonato.
Ainda é cedo para dizer que este Benfica já exorcizou parte dos seus fantasmas. Jesus recusa admitir que eles andam no ar, e a derrota em pleno Estádio do Dragão apenas vem adensar as incertezas sobre um final de época que, quer se queira quer não, mantém a cicatriz - feita em Maio passado - aberta. E este ano, especialmente este, teria sido ideal para a coser: o FC Porto está fisicamente no 'red line' e, borrifando na defesa de Luís Castro aos seus pupilos, a sua equipa é aquilo que apregoam sim. Ou seja, está a anos-luz da qualidade/quantidade do rival lisboeta. Esta inércia em terreno nortenho é uma péssima notícia para todos os aficionados benfiquistas, pois o Benfica ainda se desloca - pelo menos - mais duas vezes àquele Coliseu escaldante. Um bloqueio mental com mais de duas décadas, diga-se. Em vinte e três anos de confrontos no feudo portista, apenas em duas ocasiões foram capazes de desmontar o cenário, habitualmente trágico, e fazer dele palco cómico: a primeira chegou pelo 'bis' de Nuno Gomes (sim, numa partida talvez mais recordada pelas múltiplas cabeçadas de Bruno Alves); a segunda, já sob a égide de Jorge Jesus, na primeira mão da Taça de Portugal 2010/2011.
Invocar razões várias para o sucedido é contraproducente com tudo aquilo que foi escrito em cima, pois está na cara que o bloqueio se deve a factores psicológicos e a um respeito exagerado de Jesus ao FC Porto. O circo da visita do Benfica ao Porto é um espectáculo que transcende o plano desportivo e, mentalmente, os encarnados não sabem jogar tão bem com isso como o fazem os azuis e brancos, hábeis a fazer destas recepções uma espécie de tábua de salvação para épocas horríveis. Como esta está a ser, note-se.
Visão do Leitor (perceba melhor como pode colaborar no VM aqui!): A. Borges
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