Que este Natal sirva para recuperar os Valores da Trégua de 1914

Frente Ocidental, Dezembro de 1914. Em plena Primeira Guerra Mundial, estes campos Belgas e do Norte de França são uma triste coleção de terror, medo e descrença. De surgimento da morte, que se passeia por ali com a mesma naturalidade com que o peixe se move entre o cardume, matreiramente à espera de convidar (sem possibilidade de rejeição) alguma pobre alma para que a acompanhe na sua lúgubre viagem. Estamos perante alguns dos momentos mais agónicos da história da humanidade, vivendo esse cavalgar de desgraças que, eufemisticamente, se chama guerra. Mas o inesperado nunca se faz esperar, e por aqui está prestes a ser vivido um dos episódios mas marcantes, belos e mágicos da história recente da Humanidade. 

O Capitão Cheater era mais um dos homens que vivia aquela triste rotina nas trincheiras, servindo o segundo batalhão Gordon Highlanders naquela Frente. Numa carta à sua “querida mãe”, que, à partida, narraria horrores e torturas, ele descreve “uma das mais extraordinárias visões que alguém alguma vez presenciou” . “Eram dez da manhã quando dois alemães abandonaram as suas trincheiras e vieram na nossa direcção. Nós íamos disparar quando vimos que estavam desarmados, e nesse momento um dos nossos homens foi ao encontro deles. Dois minutos depois, o espaço entre as linhas de trincheiras rivais estava repleto de soldados de ambos os lados, apertando as mãos e desejando Feliz Natal uns aos outros”. Durante este singular momento da História, um evento abrilhantou ainda mais a Trégua de Natal de 1914: as tropas inimigas juntaram-se para, na Terra de Ninguém, disputar um jogo de futebol, cujos contornos, resultado e mesmo local exacto não são todavia absolutamente claros para os Historiadores (apesar de já poucas dúvidas subsistirem sobre a sua realização). 

Quer isto dizer que, durante um dos períodos de maior ódio da História Mundial, o futebol servia para unir, para pacificar, para gerar amor, amizade e fraternidade. De facto, o que pode pode ser mais universal do que a bola, expressão humana sem qualquer fronteira? Naquele momento, facções foram ignoradas, pistolas silenciadas, até a morte não foi convidada, sendo a sua presença substituída pela camaradagem gerada pelo Desporto.

No século que se seguiu a este episódio, o futebol perdeu demasiadas vezes este papel. O papel pacificador foi substituído por uma forma de gerar ódios, a união deu lugar a divisão, o simbolismo da Frente Ocidental deu lugar ao de Heysel ou Hilsbrough. A bola continua ser o mais importante, o jogo continua a ser o mais Universal, mas há quem teime em não respeitar o seu valor simbólico e os valores da Trégua de 1914.

Feliz Natal e votos de que, em 2016, o Desporto seja uma manifestação de fraternidade, cultura e união.

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