O PAEC do futebol português

Não deixa de ser curioso que no ano em que se cumpre o 40º aniversário de um dos mais famosos acrónimos da nossa língua (PREC) tenha irrompido em força algo que justificará o baptismo de um novo acrónimo: o PAEC (Processo de Ajustamento Em Curso) do futebol português.

Não que ele não tenha dado em anos anteriores alguns sinais fracos da sua inevitabilidade. Todos estamos recordados da complexa operação que nos idos de 2009 (?) conduziu a que o estádio da Luz passasse do chapéu do clube para o chapéu da SAD. De qualquer das formas é preciso recuar ao ano de 2013 para situar o verdadeiro nascimento do PAEC do futebol português. Mais precisamente à eleição de Bruno de Carvalho como presidente do SCP. Confrontado com o abismo não teve BdC receio de meter mãos à obra, desenvolvendo uma estratégia que podemos situar em 2 níveis: Um interno que se traduziu numa revolução do Sporting (simplificação de estruturas directivas e num corte radical de gastos com o futebol). Um segundo na negociação de uma reestruturação do seu passivo com o sistema financeiro. Do primeiro não parecem surgir grandes dúvidas sobre a sua implementação. Já no segundo (e após um período inicial em que houve divulgação pública dos seus contornos) não tem havido grandes notícias sobre a sua implementação (e já lá vai quase um ano e meio desde a eleição de BdC).

Já em 2014 o PAEC do futebol português conheceu um súbito aumento de velocidade com a entrada em cena do Benfica. No início do ano (Janeiro de 2014) não pareceu que o SLB se estivesse a juntar ao referido PAEC. Contudo os acontecimentos do actual defeso não parecem deixar grandes dúvidas sobre a sua adesão ao mesmo. Ao contrário do que alguns entendidos que apregoavam (o descalabro de um dos concorrentes por contraponto com a excelência da situação do seu clube de eleição), eis que o SLB procede a um abrupto desmantelamento da sua equipa de futebol. Da equipa habitualmente utilizada por JJ na última época já saíram 5 jogadores. E a fazer fé nas notícias que todos os dias saem nos jornais estarão mais 2 na porta de saída.

O único que tem vindo a resistir à adesão a este PAEC é o FC Porto. Sem total sucesso como a gestão do plantel tem vindo a demonstrar. O surgimento dos empréstimos com opção de compra é um claro exemplo do que atrás afirmei. Parece claro que mais tarde ou mais cedo (daqui a um ano?) também o FCP terá que se tornar sócio de pleno direito deste PAEC.

Um desafio interessente é tentar ver o que vem a seguir à curva (findo o PAEC) para cada um dos 3 grandes e para o futebol português.

Comecemos pelo Sporting. 2 notas. A 1ª é que como se perspectiva, se o SCP não tiver capacidade para reembolsar os VMOC alinhavados na reestruturação financeira em curso podermos ter uma situação em que os bancos passem a ser donos da respectiva SAD. Passemos à 2ª nota. Neste ponto deixem-me introduzir uma dúvida (cujo esclarecimento solicito a quem esteja por dentro do assunto): na reestruturação em curso está previsto que à semelhança do que sucedeu no caso do SLB o estádio passe para o “chapéu” da SAD? É que se tal vier a acontecer (e num cenário mais negro em que a SAD não venha no final do processo a ser solvente) o destino do principal activo (o estádio) fica nas mãos dos credores. Bem sei que estamos em Portugal e consequentemente provavelmente nada se vai passar mas não deixa de ser um cenário pouco agradável. No caso do SCP sinceramente (e dado o valor do seu passivo) parece-me que o cenário é bem negro.

No caso do SLB (e não obstante um valor do passivo que aparentemente é superior ao do Sporting) a situação parece-me bem melhor. A capacidade de geração de receitas (induzida pela dimensão do clube) confere-lhe uma maior capacidade de no final do processo estar em melhor situação do que o SCP. Contudo não deixa de ser aplicável ao Benfica o que acima foi dito sobre a possibilidade do principal activo (o estádio) ficar nas mãos dos credores. Ainda por cima dado que neste caso (e fruto do descalabro verificado há uns anos atrás nas contas da SAD) o estádio já está no “chapéu “ da SAD.

Fica a faltar analisar o caso do FC Porto. O caminho que o FCP tem vindo a trilhar nos últimos anos vai apressar o fim de um modelo de negócio que compartilha com o SLB (e que assenta na realização de mais valias para financiar a actividade operacional). Com efeito o avolumar dos custos operacionais (a que não será alheia a aventura televisiva do clube) vai antecipar aquilo que os factores externos (apertar do crédito por parte do sistema financeiro e as implicações do fair-play financeiro imposto pela UEFA)) inevitavelmente vão impor. Em favor do Porto dois aspectos. O primeiro é de que o principal activo ainda não está no chapéu da SAD e consequentemente está fora das mãos dos credores. O segundo é que o valor do seu passivo nada tem a ver com o valor do passivo dos seus concorrentes.

Uma coisa parece-me inevitável. No curto prazo a competitividade das equipas apresentadas pelo FCP e SLB vai sofrer um acentuado retrocesso (fazendo um downsizing que as vai aproximar do SCP), fruto da queda da qualidade dos jogadores que vierem a ser comprados.

No meio de tantas perspectivas negativas há contudo um aspecto claramente positivo. No fim do processo (e mesmo que a contra gosto) os clubes vão ser forçados a apostar nos jovens vindos da formação. As selecções vão agradecer. E provavelmente os bancos também, porque provavelmente só assim é que conseguirão reaver os dinheiros que tão ligeiros foram a emprestar aos 3 grandes…

Visão do Leitor (perceba melhor como pode colaborar no VM aqui!): Luís Cunha

Etiquetas: