Os Red Wings e o dia em que comecei a seguir a NHL

Em 1997 havia poucas coisas a fazer a rotina de um miúdo de 10 anos. Uma delas era todos os meses comprar a MegaScore. Em 1997 o interesse pelo desporto já era grande: no ano anterior o Poborsky maravilhou-me com o seu chapéu ao Vítor Baía e os Utah Jazz davam início ao meu amor pelos underdogs. A MegaScore trazia sempre “demos” que, para mim, valiam por jogos inteiros. E, se o FIFA 97 ou o NBA Live 97 eram certos no Natal e nos anos, dificilmente o NHL Live cá chegaria. Mas aprendi. Aprendi que bastavam os Red Wings e os Capitals e horas inteiras, naquela limitação, maravilhado pela velocidade surreal com que os bits se moviam. Aprendi a perceber que, uma equipa que tinha Osgood, Yzerman, Shanahan, Kozlov, Holstrom, Fedorov ou Lindstrom só podia ser uma equipa fantástica.

Aprendi que tudo começa num face-off, com o atirar do puck (o disco) ao gelo. Aprendi que não podia “despachar” o disco antes da linha vermelha (linha de meio campo) para o fundo do campo adversário pois, se eles o apanhassem antes de mim, seria um icing. Aprendi que o jogador que transporta o disco é sempre o primeiro a passar a linha azul, caso contrário seria assinalado um offside. Aprendi que há dois tipos de remates: os wrist shots, em que o stick arrasta pelo gelo e, ainda que sejam menos fortes, saem mais colocados e os slap shots, uma pancada seca no disco que o dispara a velocidades criminosas. Aprendi que há momentos de superioridade numérica, de dois minutos, aquando do assinalar de uma penalidade. E, se marcar um golo enquanto estou em desvantagem numérica, marco um short-handed goal.

Assim, não podia rasteirar ninguém (tripping), atingi-los com o stick (slashing), empurrar alguém depois de um apito (roughing), impedir de jogar alguém que não transporta o disco (interference), usar o stick para enganchar um adversário (hooking), agarrar um adversário (holding), atingir um adversário enquanto agarro o stick com as duas mãos e o mesmo não está no solo (cross-checking), empurrar o adversário violentamente contra as barreiras se ele a elas estiver junto (boarding), placar abaixo dos joelhos (clipping), cotovelar adversários (elbowing), entre outras penalidades mais raras. Aprendi que, apesar de estranho, é um desporto onde as lutas até são permitidas! Claro que o jogador é penalizado em 5 minutos (ou 10, se a equipa decidir substitui-lo), mas acontecem e todos aplaudem. Que há 6 jogadores em campo e os cinco, excluíndo o guarda-redes, formam uma linha. Um guarda-redes, dois wingers, um center e dois defesas.

Em 2013 há coisas que não diferem assim tanto de 1997. Os Red Wings continuam uma das grandes equipas da liga e quase eliminavam os vencedores da Presidents Cup (para a melhor equipa da fase regular), os Chicago Blackhawks. E foi preciso ir a jogo sete. Aliás, foi preciso ir a prolongamento no jogo sete, tendo os Red Wings desperdiçado “três match points”. Ao ir buscar um jogo a Chicago e vencido os seus dois primeiros jogos em casa, os Red Wings chegaram mesmo a estar a vencer por 3-1 na série e com um pé na final de conferência. Mas os tempos parecem continuar negros pela cidade do Michigan e os Blackhawks impuseram-se e mostraram porque foram a melhor equipa da fase regular recuperando o 3-1 para 4-3 a seu favor. Nunca durante toda a época os Blackhawks tinham perdido três jogos seguidos mas isso não deverá funcionar como consolação para os Red Wings. Numa série sem um óbvio destaque individual, o goalie de Detroit, Jimmy Howard e Brent Seabrook pelo golo de ouro marcado, merecem uma consideração.

Ainda no Oeste, os campeões LA Kings tiveram de suar para bater os Sharks de San José, numa série tão equilibrada que foi mesmo necessário recorrer, também, a um jogo 7. Apesar de tudo parecer encaminhado para os Kings nos dois primeiros jogos em LA, o factor casa mostrou-se decisivo para o desfecho da série, já que em San José mandaram os Sharks. Não fora a melhor classificação dos Kings durante a fase regular e o desfecho poderia ter sido diferente. Apesar de Quick ter feito uma série brilhante, terminada com uma percentagem de defesas de 95% esta não foi a única razão pela qual os Kings estão novamente na final de conferência. Tal como referido, LA mostrou-se ser uma fortaleza para os Kings mas tudo poderia ter sido bem diferente não fosse um comeback à campeão no jogo dois onde já se antevia um empate da série a 1 e a anulação do factor casa. Outra razão de grande importância prende-se com o “penalty kill” dos Kings. A sua capacidade de anular situações de “power play” adversárias, que foi extremamente importante para a eliminação dos Sharks. Voynov não foi só importante nisto, como ainda contribuiu, durante a série, com 2 golos e 3 assistências marcando um total de 5 pontos. Do outro lado, custou aos Sharks a lesão de Logan Couture nos últimos três jogos. Isto, a juntar a alguma falta de profundidade do roster dos Sharks e à sua incapacidade para bater Quick, ficou ditado que os campeões continuariam a sua luta pela revalidação do título.

Pelo Este, os Bruins continuam a mostrar que são capazes do melhor e do pior. De quase eliminados pelos surpreendentes Maple Leafs, os Bruins praticamente cilindraram os Rangers que bem podem agradecer a Lundquist, Santo Padroeiro de Madison Square, o seu não varrimento. Mas os Bruins deverão, principalmente, agradecer a um surgido do nada Torey Krug que, em cinco jogos, marca 4 golos e faz uma assistência. Não menos verdade, e justiça seja feita aos Rangers, Tuuka Rask esteve, também ele, enorme na baliza dos Bruins ajudando a que a equipa de Boston alcançasse os brilhantes 4-1 com que eliminaram os Rangers, ao qual contribui o facto de Nash ou Callahan nunca terem conseguido carburar. Honra seja feita à malta de Boston, que encontrou o coração e jogou com a raça e imponência física históricas nos Bruins.

Os Bruins vão assim jogar com os Penguins naquela que era a final de conferência mais excitante possível. Serão “duas escolas” de hóquei perfeitamente distintas e frente a frente. Os Penguins que basicamente atropelaram os Senators que ainda deram um ar de sua graça ao vencer o seu primeiro jogo em casa, apenas decidido em duplo prolongamento. Uma vitória que serviu mais para espicaçar a equipa de Pittsburgh que outra coisa, já que os canadianos perderam os dois jogos seguintes por 7-3 e 6-2. James Neal com 9 pontos (5 golos e 4 assistências) e Kris Letang com 10 pontos (1 golo e 9 assistências) mostram bem a superioridade dos Penguins sobre os Senators, sendo praticamente impossível competir contra a equipa de Pittsburgh em matéria de profundidade do roster. Principalmente quando Spezza, Karlsson e Michalek se iam debatendo com problemas físicos. Os Senators cometeram ainda demasiadas penalidades sobrecarregando a sua unidade de penalty kill. Craig Anderson esteve inexcedível, mas não é o super homem.

Finais de conferência! Conseguirão os Bruins bater a dream team dos Penguins com base na sua imponência física? Será que Torey Krug irá continuar na forma brutal com que enfrentou os Rangers? Letang, Crosby, Malkin, Iginla e companhia serão demasiado fortes para os Bruins? Demasiada técnica? E, do outro lado: Conseguirão os Kings voltar à discussão da Stanley Cup? Ou os Blackhawks vão confirmar o facto de terem sido a melhor equipa ao longo da época e chegar ao jogo decisivo?

Visão do Leitor (perceba melhor como pode colaborar no VM aqui!): João Pedro Cordeiro

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